segunda-feira, 8 de novembro de 2004

Agora só falta você!

Ou: Olha só, ele usa maquiagem... mas não é gay, viu? Não é!

Quem nunca ouviu falar de metrossexual que levante o dedo. Agora, aqueles que já estão escolados no assunto, podem levantar também o dedo, só que o médio, como eu, que já estou cheio. E digo isso porque, mais do que um “novo homem”, o metrossexual é, na verdade, um segmento e um conceito frágil. E, quando alguém quer ganhar dinheiro com uma “tendência”, hum!, saia de baixo: uma lavagem cerebral está a caminho.

A perfumaria característica é: homem que vive nas grandes cidades, com idade superior a 25 anos, heterossexual, bem-sucedido, refinado, moderno, gentil e bem-humorado. O que está por trás é: homens tapados, cheios de valores que não fazem mais sentido numa sociedade onde o feminino está se sobrepondo, deixem essa história de lado, acordem e consumam outras coisas além de carro e eletrônicos! A frase que seria adequada a esse momento seria: “Agora, só falta você!”, como diria a Rita Lee. Hehe!

Desde que as mulheres saíram de dentro de casa e começaram a ter alguma influência na sociedade patriarcal judaico-cristã, principalmente assumindo atividades antes típicas de homens, como posições de comando, que eles não estão sabendo para onde ir ou o que fazer consigo mesmos. Não sabem qual é o seu lugar, onde aplicar a força, de que forma mostrar sua virilidade. Estão enredados em valores culturalmente estabelecidos que estão sendo postos em xeque, e caindo um a um, apesar da gritaria do Vaticano.

E qual é o papel do masculino numa sociedade em que o emocional está tomando o espaço do físico e da racionalidade? Não sei. Mas, já existem dezenas de livros de auto-ajuda tentando dizer alguma coisa a esse respeito. Em função disso, o que mais impressiona nessa histeria fortemente financiada pela indústria de cosméticos, confecções e acessórios é a separação que deve ficar clara na mente das pessoas: Metrossexual não é gay. Do tipo, “olha só: ele usa maquiagem... mas não é gay, viu? Não é!”. “Vê, ele joga bola. É verdade que a unha tá pintada, mas ele joga bola” Afinal, é preciso convencer o macho adulto branco que ele pode, sim, ir às compras sozinho.

Os gays já consomem. E, nesse caso, o consumo é uma forma de se auto-afirmarem, mesmo que para isso reproduzam idéias e pensamentos da sociedade que os discrimina. Ao consumir, é como se estivessem querendo limpar a suposta sujeira que é a Homossexualidade, se inserir, aderindo a valores que a sociedade consagra, no caso, roupas caras, lugares da moda, parceiros bonitos e de pele clara, carros, viagens, etcetera. Os negros, também. Ganharam visibilidade a partir do momento em que se tornaram rentáveis. Hoje, existe uma gama de produtos específicos nas prateleiras dos supermercados. E não foi necessário fazer muito esforço para convence-los a comprar.

E, aí, só faltava quem? Os homens. Eles precisam aderir às indústrias que mais crescem atualmente: a de cosméticos e a de moda. O tal "agora só falta você", inclusive, não tem dado, ultimamente, muito espaço ao macho adulto branco. No programa "Queer Eye for the Straight Guy", uma equipe de homossexuais estilosos se empenha em ensinar sofisticação e boas maneiras a típicos grosseirões heterossexuais. A reação, seguindo a fórmula que deu sucesso ao reality show de bibas, está vindo em "Straight Plan for the Gay Man’, onde quatro ‘machões’ fazem de tudo para camuflar temporariamente trejeitos e gestos estereotipados de voluntários gays. Essas "tranformações", inicialmente divertidas, têm irritado muita gente.

Uma questão de atitude

A questão é: o termo pegou e está dando certo. Os principais garotos propagandas estão sendo os jogadores de futebol e astros do rock. Nada mais viril. O discurso agora é que homem com H já pode comprar e se servir de “coisas” antes consideradas femininas, como o blush da grife Jean Paul Gautier.

Pois bem: eu digo que muito mais do que David Beckham, homens extremamente arrojados em sua “nova” aparência são os jovens da periferia de EsseEsseÁ. Estão anos luz à frente da classe média abastada. Eles fazem a sobrancelha à la Marlene Dietrich, pintam o cabelo, depilam os pêlos, vestem-se com roupas coloridíssimas que, se qualquer gay se atrevesse a usar seria linchado, e ainda pegam as mulé nos shows de pagode e arrocha. Uma questão de atitude.

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