segunda-feira, 13 de junho de 2005

Censura no cinema baiano

É o que dizem os cineastas baianos. Eles estão fazendo, desde às 9h de hoje, um protesto em frente à Diretoria de Artes Visuais e Multimeios (Dimas), órgão ligado à Fundação Cultural do Estado da Bahia responsável pela política regional de audiovisual. A causa da mobilização: a Dimas retirou de última hora da I Mostra de Vídeo – Jovens Realizadores Baianos, realizada nos dias 3, 4 e 5 de junho, em EsseEsseÁ, o vídeo “O Fim do Homem Cordial”, de Daniel Lisboa. Aqui está a programação.

O vídeo, de dois minutos e 25 segundos, se apropria de imagens do telejornal Bahia Meio-Dia, da TV Bahia, (emissora ligada a Antônio Carlos Magalhães) e de seu apresentador, Casemiro Neto, um dos mais populares da casa, e insere cenas ficcionais de um grupo terrorista, o Sub V27, que seqüestra um político influente, chamado no filme de “Cabeça Branca” e “Painho”.

O político apanha e é xingado, com cenas inspiradas nos grupos extremistas árabes, que praticam a chantagem através de seqüestros e imagens veiculadas em TVs do mundo inteiro. Mesmo com alusão explícita ao senador baiano Antônio Carlos Magalhães, o filme não cita seu nome. Frases como “A Bahia está órfã” e “Acabou essa onda de coronelismo na Bahia”, também são citadas na fita. O vídeo termina com o apresentador Casemiro Neto estarrecido, impotente e indignado. O ator principal é Ângelo Flávio, meu amigo. Ângelo já tem em seu currículo o prêmio Braskem de teatro de melhor ator, atualmente o mais importante da categoria no estado. O senador é interpretado por Fernando Neves. Quem quiser assistir ao “vídeo proibido da Bahia” clique aqui.

- Mas que coisa mais feia. Estou chocado!

Os cineastas mobilizados estão alegando a censura porque o vídeo foi premiado na edição 2004 do Festival Imagem em 5 Minutos, realizado pelo próprio Governo da Bahia e de caráter nacional. O jornal A Tarde publicou matéria hoje na capa de seu segundo caderno a respeito da polêmica. A Associação Baiana de Cinema e Vídeo (ABCV) quer que a Dimas se retrate e exiba o filme no mesmo local onde foi proibido. De acordo com a matéria, o diretor da Fundação Cultural, Armindo Bião, disse que não atenderia à solicitação de exibir o filme na sala, alegando que a decisão já havia sido tomada e o assunto deveria ser esquecido.

Existem boatos de que o filme, entre outras coisas, foi o responsável pela a saída do antigo diretor da Dimas, Sérgio Borges. Sérgio manteve a decisão do júri em premiar o vídeo de Daniel no ano passado. Além disso, o ex-diretor da Dimas disse que se afastou não por causa do filme, mas por vontade própria.

O diretor do vídeo Daniel Lisboa disse ao jornal A Tarde não tem medo dessas coisas: “Acho que Salvador vive um marasmo grande, com uma arte comprada, que se mantém passiva por conta do dinheiro que recebe para se produzir. Queria bagunça no meio dessa calmaria”. Sobre Sérgio, ele disse: “Ele evitou uma grande mancha na história do audiovisual baiano ao manter a decisão do júri. Sérgio Borges foi um cara que ficou do lado da arte e não da politicagem, e isso deve ficar marcado para sempre”.

A Dimas, obviamente, nega a censura. Seu atual diretor, Jamison Pedra, classifica a ação como um simples processo de triagem. Disse ainda que além de considerar o vídeo agressivo, ele não contribui artisticamente para o cinema baiano: “O filme atinge uma pessoa, o senador Antonio Carlos Magalhães, de forma agressiva e violenta. Não acrescenta nada aos jovens, pelo contrário, incita a violência, a agressão e atinge a moral, o que não deve acontecer em relação a qualquer personagem”, falou ao jornal.

Casemiro – A grande questão, pelo menos para mim que vi o vídeo, é saber como as imagens de Casemiro foram gravadas ou obtidas. O diretor de jornalismo da TV Bahia, Carlos Libório, disse que o apresentador não esboçou nenhum tipo de reação (!?), apesar de não ter surgido nenhum pedido de uso das imagens. “Não cogitamos nenhuma atitude judicial contra o filme”, revelou.

Bem... O Fim do Homem Cordial está sendo apresentado nacionalmente por meio do circuito brasileiro de festivais. Agora, ele está sendo conhecido no meio cinematográfico do país como “o vídeo proibido da Bahia”, como aconteceu durante o 15º Cine Ceará, que terminou quinta-feira.

De acordo com Daniel Lisboa, O Fim do Homem Cordial refere-se à tese do historiador Sérgio Buarque de Holanda de que o brasileiro é um homem cordial. “Queria, justamente, discutir a passividade da gente, de aceitar tacitamente mensagens, subtextos, intenções”, disse. “O que fiz foi - graças à tecnologia - me apropriar das imagens do telejornal, modificá-las e jogá-las de volta com outro significado. Por tudo isso, meu vídeo é, também, um ato de terrorismo. Mas, se se pegar cada pedacinho dele, vê-se que está cheio de sentido. O mal é que as pessoas só pegam a coisa de ACM, não se detêm nos detalhes”, disse Daniel ao jornal A Tarde.
.

Nenhum comentário: