sexta-feira, 27 de janeiro de 2006

Diga graaaana!

Ou: O Big Brother chinês

Democracia
Liberdade
Direitos humanos
Taiwan
Dalai-lama
Tibete


Essas são algumas das palavras às quais os chineses não têm acesso na internet. O governo de lá, apesar de permitir o uso da web para educação e negócios, exerce um rígido controle sobre o conteúdo que é publicado. Em função disso, o Google, para entrar no mercado de cerca de 100 milhões de pessoas (o segundo maior do mundo), não se fez de rogado. Na quarta-feira, finalmente capitulou e passou a permitir que o governo chinês decidisse sobre o que deve e o que não deve aparecer em seu buscador. Os internautas que procuram algumas das palavras citadas logo acima são direcionados a endereços que divulgam opiniões oficiais do país. Preocupante.

Novas construções convivem com cultura milenar

Com isso, o Google entra para a lista das empresas que, para ganhar dinheiro, abaixam as calças e deixam que o governo pratique a censura em seus conteúdos. O Yahoo e a Microsoft já fazem isso há algum tempo e estão ganhando dinheiro, apesar de tudo. Afinal, a China é o país que mais recebe investimentos estrangeiros no mundo e o mercado é incomum: acima de 1 bilhão de pessoas, seis vezes maior que o do Brasil. Na quarta-feira, foi divulgado que, com o crescimento do ano passado, o país passou a ser o quarto mais rico do mundo, atrás dos EUA, Japão e Alemanha e à frente da Inglaterra e da França. Dentro de 30 anos, passará os Estados Unidos.

Como toda ditadura (eu os vejo assim), o governo chinês tem medo de informação. E a liberdade de expressão proporcionada pela internet o incomoda. E muito. O discurso oficial para as ações restritivas diz que a internet é um lugar "sujo", onde se tem acesso a informações "nocivas sobre cultos religiosos, política, superstição e pornografia". A conseqüência disso é que em 2004 (só tenho esse dado), foram fechados cerca de 13 mil cybercafés. Em Xangai, maior cidade do país, câmeras de vídeo vigiam locais públicos de acesso à internet para verificar se os usuários acessam páginas proibidas. Criticar o governo abertamente na rede nem pensar: pode dar cadeia. E foi isso o que aconteceu com três estudantes universitários, condenados em 2001 a oito anos de prisão cada um, após defenderem, via internet, a necessidade de reformas democráticas no país. Também não são poucos os chineses presos e torturados por se manifestarem contra o governo.

Mais de 1 bilhão de pessoas. Quando nascem, nascem muitos. Quando morrem, mais ainda...

Um fato curioso é que o governo vem cadastrando "comentaristas on-line" para atuar em fóruns e salas de bate-papo para defende-lo de comentários negativos. Pior: desde setembro do ano passado está vigorando a determinação de que os sites chineses que quiserem publicar notícias deverão pedir aprovação do governo. Organizações como Repórteres Sem Fronteiras e o Comitê para a Proteção de Jornalistas criticam o país pela crescente censura. Os líderes comunistas chineses foram qualificados pela Repórteres Sem Fronteiras como "os maiores inimigos da liberdade de imprensa".

Bem... Ninguém sabe o que realmente acontece na China. Ou, então, quem sabe, não diz. Fica debaixo do pano. Em diversos relatórios de organizações internacionais o país é citado por desrespeitar os Direitos Humanos. Os prisioneiros políticos lotam o sistema penitenciário e são submetidos a tortura, cárceres precários e julgamentos sem direito a defesa. As execuções ainda são comuns. O país é campeão em pena de morte. Há ainda campos de trabalhos forçados e é alto índice de trabalho infantil. Não poderia deixar de falar na perseguição religiosa. O governo nega tudo. É por essas e outras que gostaria muito de bater um papo com Sônia Bridi, correspondente da Rede Globo em Pequim. Como é que o governo chinês lida com os correspondentes?

Festival da Primavera, que começa neste domingo

Essa é uma das perguntas que me faço. Outra é: Se a China está dando tão certo, será que em algum momento ela levantará a hipótese de ser um país democrático? Por que os americanos (excluindo as organizações não governamentais e a ONU) e os europeus não pressionam o governo chinês assim como fazem com os árabes e cia.? Bem... Recentemente, um repórter fotográfico em vez de pedir que as pessoas mais fechadinhas falassem o tradicional “xis” para sairem menos enfezadas na foto, ele soltou sempre a pérola: "- Diga: graaaaana!" Pois é, os tempos são outros. Compra até ideologias.

Bem, a democracia não é perfeita. Nós brasileiros sabemos muito bem disso. Nossa Constituição é desrespeitada em plena luz do dia. Mas até agora é o sistema menos ruim de organização criado pelo homem. Todas as democracias, embora respeitem a vontade da maioria, têm por obrigação proteger os direitos fundamentais dos indivíduos e das minorias. E estas, principalmente, devem acreditar que o governo vai proteger os direitos humanos fundamentais como liberdade de expressão, de religião e de crença, julgamento justo e igual proteção legal, além da liberdade de organizar, denunciar, discordar e participar plenamente na vida pública da sua sociedade.

Para chegar a esse estado, é preciso amadurecimento. Não acho que seja um processo natural. Não é enfiando goela abaixo, como os americanos fizeram no Afeganistão e estão fazendo no Iraque, que esses lugares se tornarão democráticos. A minha geração não sabe o que é censura nem repressão. Pode criar blogs, fotologs, freqüentar orkuts da vida; as mulheres votam, dirigem e não são apedrejadas por isso. Posso dizer que a Bahia é o cu do mundo e fazer piada com nossos políticos, de Lula a ACM. Enfim... temos liberdade de expressão.

Se o Google quiser ganhar dinheiro, isso é problema dele. Nós também fazemos nossas concessões no nosso dia-a-dia. Porém, na medida que todo mundo diz "a bênção" para algo que o mundo chamado "civilizado" condena, isso é um precedente para algo muito pior. O contraditório foi que o Google negou passar informações de seus usuários para o governo americano, alegando que isso fereria a liberdade das pessoas. Hummm, sei não... Só sei que em 2008 a China sediará as Olimpíadas e o que veremos por todo lado serão propagandas de que lá é o futuro da humanidade. Deus me livre e guarde! Mas, em todo o caso, se eu já aprendi inglês, por que não mandarim?

Veja aqui slide show com fotos da China.

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