quinta-feira, 31 de março de 2005

Maktub

Não tenho mais a mínima paciência em ouvir falar de Paulo Coelho. Depois que as três maiores revistas semanais do Brasil tiveram a sacada genial de publicar ao mesmo tempo matérias sobre o mago em suas capas, meu limite de tolerância chegou ao fim. Só me resta dar os meus parabéns à assessoria de imprensa do “escritor”. Primeiro porque as reportagens parecem ter sido escritas pela mesma pessoa. Depois, por causa da bajulação e informações infundadas a respeito do autor, sua obra e importância na literatura nacional, para não dizer internacional. Será que não foi o próprio mago quem escreveu? Sei não.

Bem, não sou daquele tipo de pessoa que não lê e não gosta. Li Paulo Coelho, sim. Há uns 13 anos atrás, li até o fim os livros (manuais) Diário de um mago, O Alquimista e Brida. Não me lembro se li As Valquírias... Enfim... Também cheguei a acompanhar algumas de suas crônicas Maktub, chegando a recortar algumas delas, inclusive. Anos mais tarde, tentei ler Nas margens do rio Piedra eu sentei e chorei. Capitulei: não consegui passar da quinta página. Definitivamente, cheguei a conclusão de que não é o meu tipo de leitura preferida. Mas acho digno as pessoas adorarem as palavras e idéias do mago, mesmo aquelas que se repetem ad infinitum.

- Sabe? Basta ser sincero e desejar profundo.
Você será capaz de sacudir o mundo. Vai!

Não há escapatória: Já são mais de 65 milhões de livros (manuais) vendidos. Anônimos e celebridades, ricos e pobres adoram as histórias de Paulo Coelho, de 59 anos. Entre as personalidades internacionais que já declararam publicamente serem fãs do mago, estão Bill Clinton, Shimon Peres, Russell Crowe, Sharon Stone e Madonna.

Mas, quando a deslumbrada Veja diz que o mago é o mais global e influente dos brasileiros, o que ela está querendo provar? Influente em que? Se ele vendeu esse tanto de livros, quem é realmente o beneficiado? Não é ele e seus editores? Será que este feito o igualará a Machado de Assis, Guimarães Rosa ou Clarice Lispector, que vendiam e vendem modestas edições de dois ou três mil exemplares? Em 2002, assumiu uma cadeira na Academia Brasileira de Letras. Mas, em um lugar em que até José Sarney é chamado de imortal, tudo pode acontecer. E acontece.

Com 19 livros editados, Paulo Coelho já foi traduzido em 56 idiomas e publicado em 150 países. Seu livro (manual) mais vendido é O Alquimista, com 27 milhões de cópias. Quem quiser papel de parede para enfeitar o computador, pode pegar aqui. É de graça.

Sabe, os livros de auto-ajuda são o grande filão do mercado editorial. Paulo Coelho está rico e vive nos Pirineus, entre a França e Espanha. E, Justiça seja feita ao mago: ele não responde às críticas, não sai caluniando e difamando nenhum dos que fazem restrições à sua obra. Segue fazendo aquilo em que acredita, fiel a seu "projeto literário" desde os primeiros passos. O que acontece é que a imprensa continua nos devendo um perfil de seu percurso. Um bom começo de pauta seria consultar quem entende do processo literário para avaliar seus momentos decisivos. E não apenas considerá-lo como espetáculo, fenômeno de globalização ou uma lenda.

Big Brother:

Se me perguntarem se a vitória do professor e jornalista baiano Jean Wyllis no BBB5 significa alguma coisa, hummm... muda alguma coisa, direi: Não significa absolutamente nada. Nada. Análises sobre esse tipo de programa não chegam a lugar nenhum. Big Brother é apenas um programa de televisão. Só isso. Deixem de viagem. Lembram da história das meninas que fugiram para EsseEsseÁ, que publiquei no post de 17 de fevereiro, não é? Pois é.
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terça-feira, 29 de março de 2005

O céu é o seu limite?

Tá bom. Vamos combinar que ninguém é santo. Eu não sou, tu não és, ele não é, nós não somos, eles não são. Portanto, vamos combinar mais uma coisinha: qual é o limite de se aceitar uma derrapada daquelas. Explico: você, enfim, aceita se encontrar com uma criatura bem apessoada, mas que você não dava a menor bola. Afinal, você conheceu numa festinha particular e ela estava aos beijos e amassos com outra pessoa e você, evidentemente, não é do tipo que quer encrenca. Tem a sua própria fila pra cuidar.

Além disso, era uma das principais participantes de uma ação bastante comum dos jovens atualmente: a conferência. Sem ter o que fazer e falar (não têm assunto), todos então pegam o celular de uma operadora em comum, ligam para uma pessoa qualquer (mas que alguém tem o número) para “se divertir”. O otário atende. Alguém do grupo se dispõe a passar o trote e as outras ficam ouvindo e curtindo a cantada. “- Oi, te vi em tal festa/bar e estou a fim de te conhecer. Você não sabe quem eu sou, mas você é assim e assado. Blá, blá, blá. Quero encontrar com você hoje”. São nove horas da noite de domingo! Meia hora depois de conversa, o songo mongo aceita o convite para dali a uma hora, mas pergunta: “- Que barulho é esse?”. E a outra: “- Ah, é que eu estou numa festa e tem gente conversando alto”. Mentira: eram os outros dando risada. Bonito, não? Uma dica: certifique-se, ao falar no celular, de que está conversando com uma única pessoa. Ou então, se for precavido, não faça declarações que possam servir de riso alheio. Telefone é um perigo nos dias de hoje.


Encontro marcado, ela enche a tua bola, fala maravilhas de você: que ficou encantada, etc., e que provavelmente você teve uma impressão errada dela. Aí você corta: “- Provavelmente não, tive mesmo”. Mas aí, você já bebeu umas três caipirinhas e duas cervejas e então tudo fica divertido, inclusive quando diz que o caso que estava com ela não era assim tão sério. Mas aí, você já bebeu umas três caipirinhas, duas cervejas e acredita.

Você começa a gostar, blá, blá, blá, e partem para mais encontros. Aí, definitivamente achando que você nasceu ontem, começa a dizer lorotas: “- Ah, não posso ir à praia porque só tenho R$50,00 e não consigo trocar. Vou ficar em casa”. No domingo à noite, dois dias sem ligar: “- Ah, fui no sábado para Paulo Afonso e só voltei agora”. Paulo Afonso fica a 471 km de Salvador. Alguém merece?

Engraçado que desrespeito é bem mais grave do que uma traição. Traição até dá pra perdoar, contanto que não haja repercussão, ninguém fique sabendo, pode até ser. Mas como voltar a confiar em alguém que um dia te enganou, mentiu? Que seja o amor de sua vida, seu amigo, o padeiro, confiança quando acaba é para sempre. Ou não? Eu mesmo tenho uma grande facilidade para eliminar gente de meus contatos (não, não contrato pistoleiro) e não sofrer por isso. Talento. Dia primeiro de abril está chegando aí. E vamos combinar mais uma coisa: a fila tem que andar. Sempre. Como diria minha baiana de acarajé favorita: - Próximo!
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segunda-feira, 28 de março de 2005

Eu só quero chocolate

Pois é. Findo o trabalho, qual a recompensa que me dou? Chocolate. Não resisto, sou fanático, viciado, e capaz de cometer loucuras por uma simples barrinha. É evidente que não espero a Páscoa para cair de boca no alimento dos deuses. Isso eu faço semanalmente. Mas, nesta época de sangue, dor e renascimento, eles estão por todo lado. Por isso, faço questão de dar e me dar este prazer, sem culpa. Como resistir? Este ano recebi três. Filei uns quatro.

Dizem que a história do "tchocolath" começou há séculos atrás, com as civilizações asteca e maia, na América Central, mais precisamente onde hoje ficam os territórios do México e da Guatemala. Lá no México, os astecas cultuavam o deus Quetzalcoatl. Ele personificava a sabedoria e o conhecimento e foi quem lhes deu, entre outras coisas, o chocolate. Os astecas acreditavam que Quetzalcoatl trouxera do céu para o povo as sementes de cacau. Eles festejavam as colheitas com rituais cruéis de sacrifícios humanos, oferecendo às vítimas taças de chocolate.

O imperador asteca Montezuma chegava a beber mais de 50 porções por dia - e cuidava sempre de tomar uma dose extra antes de entrar no seu harém. Isto fez com que Cortez, o conquistador europeu, e seus homens acreditassem que o chocolate poderia intensificar sua performance sexual. Ao retornar à Espanha em 1528, Cortez presenteou o Rei Carlos V com algumas preciosas sementes de cacau - e a partir daí, o chocolate começou definitivamente a fazer sua história, tornando-se tão popular e valioso na Espanha que sua produção foi mantida em segredo por mais de um século.

A escassez de chocolate durante o século XVII fez com que este se tornasse um presente de excepcional valor. Contudo, os monges monastéricos espanhóis, responsáveis pela manufatura do líquido, não conseguiram escondê-lo por muito mais tempo. Durante boa parte do século XIX, o chocolate continuou a ser consumido exclusivamente na forma líquida - mas a partir de 1861 passou a ser vendido na forma sólida, acondicionado em caixas com formato de coração. E apenas em 1876, em Vevei, na Suíça, o chocolatier Daniel Peter desenvolveu a técnica de adição de leite ao chocolate, criando o produto final que consumimos até hoje. Veja mais sobre a história aqui.

Como não ficar com água na boca com o filme Chocolate, com Juliete Binoche? Na película, às vezes cansativa, ela prepara delícias achocolatadas que fazem famílias se reconciliarem e casais voltarem a se apaixonar. Sei que é exagerado. Mas quem me dá chocolate já tem meio caminho andado. Outra coisa: sei que é pouco recomendado para a turma das dietas. Sei que é proibido em qualquer spa. Mas, em quanto puder... eu só quero chocolate. Alguém tem uma barrinha aí?
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quinta-feira, 17 de março de 2005

- Diga xis!



Desculpem a ausência. É que eu estou correndo mais que interno da Febem. Oportunidade que surge não se deve renegar, não é verdade? É o dinheiro, caralho!
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sexta-feira, 11 de março de 2005

Senhora do Destino

Ou: Nascer, crescer, reproduzir-se e morrer

Quando ouvia essas palavras no primário, na época em que estudava Ciências e tinha que decorar que o homem era composto de cabeça, tronco e membros, achava um tanto quanto determinista essa sina humana. Mesmo não tendo noção do que fosse, por exemplo, fenômenos como suicídio, Igreja Católica, desemprego, sonhos, Fernando Pessoa, aborto, tempo, medo, romantismo, frustração, assassinato - ou outras tantas coisas que interferirão de certo modo nesse mantra biológico - o fato é que com sete ou oito anos já via minha vida sendo resumida a quatro palavras. Ficava com raiva, desolado, com uma nostalgia que naquele momento eu não saberia dizer o motivo. Coisas de criança.

- Eu nasci, cresci, me reproduzi e vou casar. Eu sou a mocinha

Pensando bem, até que nos animais irracionais essa condição era para mim bem lógica. Afinal, eu via um pinto nascer, crescer, dar pro galo, botar ovo (reproduzir!) e morrer. (Sim, minha casa tinha quintal quando eu era criança). Engraçado que minha mãe nunca me deixou ver como se matava uma galinha. Ela fechava a porta da cozinha e dizia: - Saia! Até hoje, tenho um certo bloqueio com relação a isso. Horas mais tarde, via a coitada da galinha morta sobre a mesa. E, não sentia remorsos não, viu? Aliás, com um tempero maravilhoso sobre a ave, nem me lembrava mais dela.

- Eu vou morrer. Eu sou má e seca. Mas, também quero me reproduzir! Só a retirante é que pode dar ao mundo um bando de faveladinhos, é?

Por outro lado, tinha os animais que eu, digamos, desenvolvia sentimento, como os cachorros (da família) Playboy, 13 anos, Lassie, 8, e Bárbara Catarina, 1, que morreram respectivamente de velhice e atropelamento (as duas últimas). Havia cágados, gatos e também um periquito australiano que era tratado como periquita. (Simplesmente todos achavam que era fêmea. Até ovo botou o coitado. Morreu, aos sete anos, ao avançar sobre Shayanne, uma pastor alemão, recém-chegada, que ainda não tinha sido catequizada na convivência entre diferentes lá em casa. A cadelinha não contou conversa: resolveu brincar com o periquito como se ele tivesse o seu tamanho. Não gosto nem de lembrar. O periquito só faltava falar... Pronto, Já saí do tema!

- Alguns pensam que eu sou um aborto. Mas eu nasci e cresci. O que é reproduzir, hein?

A vida desses animais mais próximos tinha, então, uma peculiaridade: seguiam seu ciclo, sem chamar muita atenção, até que... morriam. Era muito trágico. Provavelmente, foi o meu primeiro contato com a morte e com o crescer. O engraçado é que quando criança, o crescer passa meio lento. O dia é mais longo, o Natal e o nosso aniversário não chegam nunca e as distâncias são maiores. Tudo demora. Depois vem a adolescência e vamos crescendo e aprendemos, assim, que aos trancos e barrancos temos que seguir em frente. Hoje, fico realmente fascinado com a visão que adquirimos das coisas, das pessoas e da própria vida ao longo do tempo. Se eu comparar o que penso e faço hoje com o que eu pensava ou (não) fazia há cinco anos, por exemplo, nossa, que mudança absurda! Não tem nem graça voltar no tempo, que por sinal passa cada vez mais rápido.

- Nós juntas não podemos reproduzir, né, Mylla?
- Ainda não. Por enquanto, só podemos adotar!

Falo isso observando as mudanças físicas também. Muita gente reclama da força que o tempo exerce sobre o corpo. E elas têm razão, ele é implacável mesmo. Quando vejo minha avó de 95 anos, por exemplo, (ela é de alguma forma um espelho) dá um certo espanto notar como a pele fica marcada, enrugada, despregada do corpo. Por outro lado e em compensação, o que ela diz não tem preço. É aquela coisa: sabedoria só vem com o tempo. Pois, no quesito de mudanças físicas, modéstia à parte, vou indo muito bem, obrigado. Cada dia melhor por sinal. Ver fotos antigas melhora minha auto-estima pra caramba. Passei a gostar da forma que meu rosto está tomando, mais adulto, forte. Entre outras mudanças, evidentemente. Resultado: só tenho a ganhar com esse tal crescimento. Espero.

- Eu morri e vou pro inferno.

Aliás, é com esse crescer, que minha Pró de Ciências não disse, que vem as conquistas, as decepções, os amores, queixas, ódios, irritações que não aconteciam antes, descobertas, amizades, desencontros, desilusões, frustrações, vitórias, perdas e um emaranhado de acontecimentos e sensações nada fáceis de compreender. Um susto e uma surpresa atrás do outro praticamente. Por isso que sempre falo uma frase de Gabriel Garcia Marques que li em "O amor nos tempos do Cólera": Que “Deus (!?) nos dê aquilo que somos capazes de suportar”. Afinal, nossos problemas e dores são sempre maiores e mais fortes do que os alheios, não é verdade?

- Eu também morri e agora sou uma alma penada!

E aí vem os questionamentos dos os efes e erres da vida, pomos nossas máscaras (a depender das pessoas e situações) e seguimos os padrões. Ou lutamos contra. Afinal, qualquer padrão exclui e serve de infelicidade para pessoas que não se adaptam a ele. Começamos a amar, a nos misturar, a procurar identificações. E aí vem a história da reprodução.

Não, ainda não penso e nem quero fazer isso atualmente. Pra dizer a verdade, nem me preocupo. Mas percebo que é uma vontade que a cada ano ganha um peso maior. É alguma sina, o querer cuidar de alguém, ver o seu crescimento e suas peculiaridades, perpetuar a espécie? Como é ser alguém que não deixa descendentes e dá uma de Brás Cubas, aquele personagem de Machado de Assis que disse “Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado da nossa miséria”? Também tem a questão da adoção? Mas, e daí, será que é legal? E aquelas que ficam pra tia? Enfim... o que dá se a pessoa resolve sair do padrão? (Olha ele sempre presente!). Nós temos o poder do livre arbítrio, ou não? Qual a diferença entre ter descendentes na velhice ou não ter descendentes? Quer saber... ainda é muito cedo pra falar sobre isso. E não vou nem comentar sobre o morrer. Afinal, ninguém voltou para dizer como é que é, e eu também não estou a fim de experimentar por enquanto.

Bonus Track
Termina hoje, a novela Senhora do Destino, da Globo. Sinceramente, não achei a menor graça. Tirando a vilã Nazaré, não sobraria muitas coisas. Fazer o quê, não é? Senhora do Destino é o maior sucesso da Globo nos últimos nove anos e a novela mais vista pelos brasileiros. Agora, vai começar o samba do crioulo doido da Glória Perez, América.
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quinta-feira, 10 de março de 2005

Pra quê Lenny?


Apesar de não contar com a apresentação de Lenny Kravitz, EsseEsseÁ neste mês de março terá grandes shows de novos e grandes nomes da MPB. Foi bom ser assim: o meu rico dinheirinho, por sinal, será melhor direcionado. Entre os novatos, está a mato-grossense Vanessa da Mata. Ela se apresentará amanhã, pela primeira vez, na mais importante casa da cidade: o Teatro Castro Alves. Isso é significativo porque demonstra o crescimento de uma das melhores revelações dos últimos anos na música nacional. O show será baseado no CD “Essa boneca tem manual”, seu segundo trabalho, que me agradou bastante. É dele as canções “Ainda bem” e “Música”, que emplacaram nas rádios (o que não quer dizer nada sobre a qualidade delas). Vale conferir.

No sábado, o destaque na cidade fica por conta do ministro Gilberto Gil. Ele mostrará o seu show Eletracústico, onde comemora 40 anos de carreira. Nele, serão apresentadas pelo cantor suas canções de maior sucesso (clássicos), como “Refavela”, “Andar com Fé”, “Aquele Abraço” e “Se eu quiser falar com Deus”. O show acontecerá na Concha Acústica do Teatro Castro Alves.

Tem mais: na próxima sexta, 18, Zizi Possi também estará na Concha e nos dias 19 e 20, Maria Bethânia, comemorará 40 anos de carreira, apresentando o show “Tempo, tempo, tempo”, no TCA.
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terça-feira, 8 de março de 2005

Ser Mulher

Ou: as feias que me desculpem, mas beleza é fundamental *

Sabe o que eu acho do Dia Internacional da Mulher? Importante e necessário. Uma consquista. Sabe o que eu acho das homenagens às mulheres no Dia Internacional da Mulher? Dispensável. Pelo menos, 90% de tudo o que se ouve e se vê nesse dia pode ser considerado discurso vazio e repetidor. Isso mesmo. Simplesmente, acho esquisitas determinadas homenagens com rosas e poemas melosos nesse dia. É bom deixar claro que não sou contra às celebrações. Ao contrário.

A questão é que ninguém me tira da cabeça as esquisitices e distorções que acontecem nessa data, como o título de uma matéria que um jornal publicou hoje: “As mulheres, mães, trabalhadoras, sofredoras, terão hoje todas as homenagens na passagem do seu dia”. Vejam, as três últimas palavras mudam todo o sentido simbólico da data, como a maior parte das homenagens “especiais” que acontecem no dia 8 de março. É como se, na verdade, se anunciasse: “- Amanhã, mulheres, voltem a sua realidade”.

Nesse sentido, considero mais estranho ainda quando um varejista ou seja lá o que for, como o Extra (poderia citar outros), publica anúncios homenageando as mulheres pelo “seu” dia. Mais uma distorção. Como achei uma pérola os anúncios, compartilho aqui. No primeiro deles, uma imagem de uma mulher sorrindo (elas sempre sorriem), com uma rosa vermelho-rubro no lado esquerdo (com o botão na altura de seu coração), com os seguintes dizeres: “O Extra faz de tudo para que você se sinta ainda mais mulher. Extra, o Hipermercado da mulher brasileira”. Fiquei comovido, mesmo não sendo mulher. Em outro anúncio, imagens de produtos como hidratante, deo colônia, desodorante, etc, com a mensagem: “As ofertas do Extra são uma verdadeira homenagem a todas as mulheres brasileiras”. E aí, mulher brasileira, que é que você acha desse tipo de “homenagem”, heim?

Brincadeiras à parte, o Dia Internacional da Mulher é, antes de tudo, um dia de reflexão. É um dia para se rever preconceitos e limitações que ainda vêm sendo impostos, em maior ou menor grau, a elas em todo o mundo. Não é um dia pela mulher, como se não soubéssemos de sua humanidade, (assim como não existe Dia Internacional do Homem, como muita gente sem noção questiona), mas sobre as situações pelas quais quem nasceu nessa condição passa. O escritor tcheco Milan Kundera, em "A insustentável leveza do ser", faz uma análise interessantíssima sobre isso: “Ser mulher é para Sabina uma condição que ela não escolheu. Aquilo que não é conseqüência de uma escolha não pode ser considerado como mérito ou como fracasso. Diante de uma condição que nos é imposta, é preciso, pensa Sabina, encontrar a atitude certa. Parecia-lhe tão absurdo insurgir-se contra o fato de ter nascido mulher quanto glorificar-se disso”. Acredito que essa análise pode ser, inclusive, estendida para qualquer outro grupo de pessoas: homem, negro, gay, etc.

- Ai, tá vendo como é bom ser mulher? Dá ate desconto no Extra. Tudo!

Pois bem, partindo do pressuposto de que ninguém escolhe ser homem ou mulher, “é preciso encontrar a atitude certa”. Historicamente, a mulher sempre foi excluída pelos homens. Se elas tiveram alguma participação social, sempre foi pela porta dos fundos. Afinal, os conceitos de mulher e feminino (natureza feminina) foram sempre retratados por uma ótica masculina. E, segundo os homens, as mulheres são seres de silêncio, que devem ficar com as tarefas do corpo, da procriação, da casa, da agricultura, da domesticação dos animais. E a mulher que fala ou se insurge deve ficar, na maioria das vezes, trancada em casas, escolas, conventos e manicômicos como histéricas. Até hoje, século XXI, as mulheres são trancadas. E até hoje, as mulheres que falam são tratadas como histéricas.

A verdade é que esse silêncio das mulheres teve o seu momento pérfido, quando foram levadas à fogueira, e teve também o seu momento cínico, quando foram transformadas no “belo sexo”. Condição essa produzida pela cultura com o apoio da filosofia e das artes. A produção do ideal do belo sexo, a propósito, é uma marca da modernidade. Por isso que, quando 130 operárias têxteis, ao reivindicarem a redução de sua jornada de trabalho de mais de 16 horas por dia para 10 horas, foram queimadas vivas dentro de uma fábrica, na verdade elas estavam querendo quebrar o silencio a que estavam sendo submetidas. Esse ato aconteceu no dia 8 de março de 1857 em Nova Iorque. Elas não estavam a fim de receber rosas nem descontos em supermercados. Queriam igualdade. Por isso que a questão feminina é atual e a solidariedade de todos é necessária para o próprio futuro da humanidade. Vamos celebrar as conquistas, sim. E dar rosas não necessariamente hoje, mas sempre que tiver vontade.

Bonus Track
Mais uma pérola da imprensa sem pauta.

"No Dia internacional da Mulher, duas grandes atrizes brasileiras protagonizam a eterna luta entre o bem e o mal e monopolizam a atenção dos telespectadores tupiniquins. Exageros e inverossimilhanças à parte, Renata Sorrah (Nazaré) e Suzana Vieira (Maria do Carmo), na novela Senhora do Destino, mostram como a mulher pode ser mesquinha, má, bandida ou decidia, honesta, empreendedora, encantadora, bom caráter. Nisso, elas estão em pé de igualdade com os homens. Conheçam melhor essas duas atrizes e suas histórias reais.” Agora, me digam: Tem algum sentido isso? Pode?

Bonus Track 2
Do Macaco Simão

“O mundo é das mulheres. Não adianta discutir. Aliás, se discutir, é pior! E aí diz que Deus criou o mundo em seis dias, no domingo descansou, na segunda criou a mulher. E aí ninguém mais descansou! E um amigo meu diz que vai comemorar o Dia da Mulher comendo a própria. E uma amiga me disse que vai comemorar tendo vários orgasmos múltiplos com eco. Pro prédio inteiro ouvir! E diz que mulher só transa com amor. Não é como homem que transa até com apple pie. Só porque é morna e gostosa! E uma amiga minha sapata me disse: "Eu vou comemorar o Dia Internacional da Minha Mulher. Rarará!"

* De Vinícius de Moraes.
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sexta-feira, 4 de março de 2005

Escolhas. De novo.

I
Ele abriu o freezer. Já fazia seis meses que pusera lá o coração. Achava que estava pronto para outra, agora que a esquecera. Tirou o pote e o depositou na pia. Enfiou o coração de volta na caixa torácica. Só então percebeu que ele não sabia mais bater.

II
Ele falava entusiasmadamente com ela quando a flagrou com aquele olhar maroto que antecede uma travessura. Ela o interrompeu uma fração de segundo depois dando-lhe um beijo de leve na boca e abraçando-o com genuína ternura. Ele não soube como reagir; teve ânsias de deitá-la no chão do bar lotado e possuí-la ali mesmo. Mas conteve-se. Sabia que ela confiava nele, e aqueles selinhos não eram incomuns entre eles.

Ela o olhou falando rápido como uma metralhadora, como de hábito, e sua alma tremeu. Pensou "que diabos, por que ele não me beija?". Logo começou a sorrir com os olhos e decidiu tomar a iniciativa. Queria calá-lo com um amasso poderoso, mas conteve-se. Saiu um beijo de amiga e um abraço de irmã. Ficou puta consigo mesma ao perceber que o deixara sem ação.

Foi o mais perto que chegaram de um romance.

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Estes dois textos foram retirados do "Minicontos do desconforto", de André Machado. Foi publicado no site Paralelos, que conheci por acaso, como a maior parte das coisas da net. Coloquei porque tem a ver com o texto que escrevi na última terça-feira, sobre difíceis escolhas. Só pra encher o saco. Bom final de semana para todos.
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quinta-feira, 3 de março de 2005

dePUTAdos

Sabe, eu também gostaria de ter autonomia para aumentar o meu salário em 67%. Acharia super justo. Afinal, trabalho muito, de segunda a sexta, faça chuva ou sol, e tenho (quando tenho) apenas 30 dias de férias remuneradas. Muito pouco. Meu chefe, mesmo não sabendo como, deveria apenas me pagar. Caso reclamasse, diria que um profissional francês ou americano do meu gabarito ganha muito mais, com condições de trabalho melhores. E a sociedade espera que um profissional como eu ganhe bem para não ceder a pressões externas e ferir a ética profissional ou pessoal.

Definitivamente, acredito que isso deveria constar no estatuto da empresa. Inclusive, eu também não deveria ter nenhum custo com alimentação, transporte, assistência médica/odontológica ou aluguel, nem me preocupar com contas de luz ou telefone fixo/móvel. Mas, o que ocorre é que infelizmente isso não acontece no mundo real. A não ser que você seja um dePUTAdo (senador, prefeito, presidente, juiz, etc.) brasileiro.

Cada dia que passa, o sórdido (porque irreal) episódio dos deputados federais ansiosos por aumentar seus próprios rendimentos fica mais intolerável. Acho inocente quem crucifica apenas Severino pela proposta, como vejo por aí. Ele apenas está dando sua cara (de pau) a tapa. Não tem nada a perder, como muitos políticos. Sua principal plataforma para ser eleito presidente da Câmara foi a elevação dos salários.

- Chefe, olha só. Taqui o aumento que eu me dou!
- Sei...Tá bom, fique esperando aí. Sentado, tá?

- Uó!

Também engana-se quem pensa que essas vozes que estão se levantando contra o aumento dentro do próprio Congresso não queiram elevar o valor de seu contra-cheque de R$ 12.840 para R$ 21.500. Severino, num momento de lucidez, os chamou de “demagogos”. E são mesmos. Eles estão empenhados, sim. Só precisam do momento certo. Não querem receber um 21 assim... sem aplicar uma vaselinazinha no povo brasileiro, como Severino Cabra Macho acha que deve ser. A coisa tem que ir com mais calma, devagarzinho, com jeito, e esperar que essa onda de reprovação passe. Como todo brasileiro, dePUTAdos não desistem nunca.

E como todo mundo quer se dar bem nessa estória toda, em Caraguatatuba (SP), o prefeito reajustou seu próprio salário de R$ 11 mil para R$ 18 mil. Os vereadores seguiram o exemplo. Em São José dos Campos, também em São Paulo, os vereadores de lá se deram um reajuste de 60%. Mas aí a Justiça embargou a decisão e a questão está sendo discutida. É de matar.

O que mais me deixa sem saber em que mundo estou é eles quererem aumentar em 67% seus salários. Um desses dePUTAdos chegou a dizer que pesquisas indicavam o apoio da sociedade à concessão do aumento. Não é para rir? O salário mínimo, depois de muita discussão, palavrório e acusações, vai passar de R$ 260 para R$ 300. Um reajuste de 15%. Se eles fizessem o mesmo com seus rendimentos, receberiam cerca de R$ 14.800. Por que 21? Que tara é essa, heim? Em compensação, o presidente Lula propôs 0,1% de reajuste para o funcionalismo federal. Tenho medo.

Atualização 04/03: "Eles são uns idiotas"
Enfim, a proposta de aumento de salários dos deputados foi parcialmente enterrada. A frase foi dita por Severino aos "demagogos" deputados que não tiverão colhões para enfrentar a opinião pública. Pelo menos, Severino aprendeu uma coisa: não se pode confiar em político.
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terça-feira, 1 de março de 2005

Difíceis escolhas

Ou: Dizem que a vida é simples. Eu acreditaria nisso se não fosse obrigado a tomar decisões nem escolher. Esperar decisões dos outros, então... Me mate logo.

Por acaso você está preparado para escolher? Sabia que algumas pessoas passam uma boa parte de suas vidas (ou toda ela!) questionando suas escolhas, imaginando o que poderia ter acontecido se tivesse agido de outra forma? Acredito (e não vou muito longe) que essa fase normalmente se intensifica a partir dos 30 anos: a partir daí, o muro das lamentações e do arrependimento se torna cada vez mais extenso. Pode reparar. E aí, você pensa: seria ótimo se tivesse uma segunda chance. Seria, meu bem.

A realidade, ao contrário dos livros de auto-ajuda, nos diz que não existe meio de verificar qual é a boa decisão. Aquela que nos dará o caminho da felicidade e satisfação. Aquela que nos conduzirá ao sucesso. Porque apesar de toda a estrada rodada e das armaduras e máscaras que colocamos para lutar e atuar dignamente, mesmo assim, tudo é vivido pela primeira vez e sem preparação. É como um ator que entra em cena sem nunca ter tido tempo para ensaiar. O primeiro ensaio da vida já é a própria vida e isso faz com que ela pareça sempre um esboço. Mas “esboço” não é a palavra certa para ela. Esboço é sempre um projeto de alguma coisa, a preparação de um quadro, ao passo que o esboço de nossa vida não é esboço de nada, é um esboço sem quadro.

- Ai, Jesus. Onde tá esse trem, heim?

Além disso, não existe termo de comparação para aquilo que somos obrigados a escolher em um dado momento. Por que? Porque estamos cercados por ene fatores: família, dinheiro, dependência, emprego, cidade, idade, sexo, escolaridade, amigos, amores, angústia, medo, insegurança, etc... Sempre ene fatores estarão presentes nas escolhas e a decisão que uma pessoa toma sobre alguma questão não necessariamente é a mais adequada para outra pessoa. Isso também vale para alguma resolução tomada anteriormente.

Por isso que julgar, por exemplo, uma mulher que deixou a faculdade para cuidar dos filhos e da casa e depois, abandonada pelo marido e desempregada, se arrepende da decisão, é complicado. Talvez ela realmente tenha acreditado que pudesse ser mais útil e importante no papel de mãe e dona de casa do que no de advogada. Talvez ela tenha tomado a decisão com base nos fatores que enfrentou na ocasião (“alguém tem que cuidar dos meus filhos”, “depois eu poderei fazer a faculdade”, “por que não casei com outro, cáspita?”, etc.). A personagem em questão adora um “E se...”.

Só que eu não acredito nem aceito que depois ela venha dizer que deixou a faculdade por causa dos filhos e por causa deles não realizou o seu sonho de ser advogada. Não dá pra engolir. A nossa estratégia, quando nos encontramos no córner, é sempre culpar alguém ou alguma outra coisa por ter nos forçado a tomar a decisão que não queríamos. Da mesma maneira, o que mais se ouve e vê, são relações sendo terminadas (sabotadas/boicotadas) porque A não está preparado, B está confuso, C está desempregado e D já sofreu demais. Olha os ene fatores aí! Não dá pra escapar.

Aí uma oportunidade aparece na sua vida. E você, porque não está preparado, está confuso, desempregado, ou já sofreu demais, deixa passar. Para essa situação, tenho uma comparação interessante. As oportunidades são iguais a um trem que passa de vez em quando na sua Estação. Quando um passa, você tem duas escolhas: 1) pegar o trem e sofrer as conseqüências boas ou más disso ou, 2) esperar o próximo passar. Só que tem um probleminha quanto a esse último: o próximo trem que você pensa que “agora, sim, estou pronto pra pegar”, talvez ele nunca apareça. Ana Karenina, por exemplo, escolheu trocar o marido e a sociedade por Vronski, seu amante. Terminou se suicidando. Foi uma escolha. E não adianta procurar vidente, consultar rezadeira, mãe de santo.

E por que foi que eu escrevi isso? Será que foi porque eu não tenho o que fazer? Também, mas na verdade é um desabafo, do tipo não-estou-disposto-a-esperar-decisões-de-gente-que-não-sabe-o-que-quer. Tá? Sou geminiano, preciso confabular. E, ah, quer saber de uma coisa? Tem dois tipos de pessoas: 1) Aquela que apanha da vida e aprende e, 2) aquela que precisa apanhar sempre mais um pouquinho para aprender.
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